terça-feira, 12 de abril de 2011

Na linha que cerca o mar

A ponta mais perto de casa...
Com o coração escapando das mãos (Lisboa, 2011)
Hoje o ursinho dorme no varal (Lisboa, 2011)

Foi a última cerveja da tarde (Lisboa, 2011)


Naquela hora o bar já estava tomado por pessoas que tinham saído de suas festinhas e noitadas, e já estavam tomando o café da manhã, num momento em que somente bêbados, vagabundos, velhos e trabalhadores explorados aportavam naquele lugar, que se passava por lanchonete e refúgio de gente cansada no fim da noite. Peguei a revista em quadrinhos que estou enrolando há mais de um mês e pedi minha tríade calórica clássica do começo do dia: café, coca cola e o salgado de presunto com queijo. Meus olhos estavam atentos, mas aquela cena desgastada de uma manhã atípica de domingo estava me cansando. Até respondia com um sorriso ou outro quando grupinhos de bêbados e cheirados - do que sobrou da noite - me saudavam com um copo levantado. Mas aquela porra toda não tinha nem começado.

Larguei o quadrinho e liguei o MSN no iPhone. Flávio estava on line e puxou aquele papo, achando que eu estava em Belém e havia chegado naquela hora em casa. Mas não, estávamos na mesma cidade e ele passou lá para um café onde encontraríamos os outros amigos e seguiríamos para o almoço combinado para aproveitar minhas 10 horas em São Paulo, as 10 horas que separavam o que já pode estar sendo uma das viagens mais importantes dos meus 32 anos.

Ser de Belém é foda. Torna nosso cansaço apenas uma das barreiras que se deve romper por essa sede de aventura de rondar feito cão sem dono pelo Velho Mundo. Seis horas de vôo. Péssima dormida na poltrona. O que salvou foi meu almoço com os amigos paraenses residentes em São Paulo e a carona dos cumpádis Paulinho Bicola e da Marcas.

Em Guarulhos tinha aquela fila da imigração. Mesmo em pé meus olhos pregavam. O vôo era pra Madrid e a visão daquelas beldades que o boing da Ibéria estaria preste a transportar deram uma animada nas duas horas de espera pelo embarque. Se esse vôo caísse seria a maior prova de que Deus tá de sacanagem com a gente.

Mais 10 horas de vôo, comida boa, aeromoças desajeitadas de meia idade e eu espremido entre dois machos, um espanhol que acabara de visitar a amante brasileira e um professor da USP gente boa. Belos princípios de ronco interrompidos pela vergonha nas primeiras horas. Depois rolou que foi uma beleza. Tentei ver um filme de terror uruguaio – indicado pelo amigo Rafael Guedes – e deu vergonha de, de repente, dar um desses chiliques causados por sustos e a porra do avião inteiro olhar pra mim. Parei. Vi o filme depois com meus amigos em Lisboa e, sim, teria passado uma vergonha do caralho.

Vamos logo para a parte que eu chego na Europa, certo? Desajeitado com o fone gigantesco que carregava no pescoço e com a bolsa vagabunda que resolvi trazer para deixar pelo caminho, fui ao banheiro do aeroporto espanhol fazer o que um homem deve fazer: resolver problemas. Aquele lance de escovar os dentes na pia chamou alguma atenção, mas me revelou um cara limpinho, asseado e com um hálito puro e dentes brancos pra valer.

Depois de escutar o primeiro disco do Wado inteiro na fila de embarque, finalmente entrei no jato que me levaria a Lisboa, onde meu grande irmão Randy me esperava. O ar de Lisboa já se revelou lindo, e aquele céu reportado pelo Win Wenders se mostrou da melhor maneira para mim.

Todas aquelas babaquices de que Portugal é o quintal da Europa, que estar em Portugal não significa necessariamente estar na Europa e piadas do gênero são proferidas por quem realmente não conheceu a Lisboa que conheci, mostrada magistralmente pelas minhas adoráveis anfitriãs Priscila, Lorena, além do Randy, claro. Estar do lado de um historiador formado em Coimbra e apaixonado por patrimônio histórico ajudou muito nas pernadas que demos pela cidade. Pavilhão Chinês, Bairro Alto, Sintra e o Pastel de Belém sustentaram definitivamente a idéia de que todo o brasileiro deveria conhecer seu berço, suas origens.

E por mais que situações esquisitas e de última hora tenham colocado alguma dúvida quanto ao paradeiro depois de Berlim, o deslumbramento e fascínio que uma viagem como essa não deixam nenhuma nuvem negra cobrir o céu.

Que merda de metáfora, heim?

Agora escrevo do aeroporto de Cologne, na Alemanha, que me separa de Lisboa e Berlim, minha próxima parada. Três horas de cadeira e um Word para desabafar. De vez em quando levanto a cabeça para sacar os tipos. Vi que umas pessoas me olham como se conhecessem. Sei lá, estou tendo essa impressão. Será que The Hangover também fez muito sucesso aqui? Bem, vou enterrar o boné na cara e dar umas bandas por aí. Quem sabe não dou até autógrafo?

2 comentários:

Iuri Fernandes disse...

Muito bom ler noticias suas! Continue postando as suas aventuras no velho mundo!

Luly Mendonça Ishak disse...

Amigão, me sinto viajando contigo. Não da maneira que eu gostaria. Na verdade eu gostaria de estar aí, vendo as mesmas coisas que tu. Mas provavelmente tu enxergarias muito mais coisas que eu - como está provado aqui. Teus textos tão incríveis como sempre. Tô ansiosa pra saber mais detalhes da viagem.
saudades muitas (já tava sentindo aqui em Belém, imagina agora). Escreve mais, escreve tudo! Um dia vou escrever como tu.