sexta-feira, 29 de julho de 2011

O Bom Remédio é amargo


A mão que balança a benga (Bom Remédio-PA)
 
“Ah, não te avisaram que o meu carro está sem DVD?”. Se fosse só o DVD eu estaria apenas puto da vida, mas a van que levou eu e mais 12 pessoas para Marabá, no final de semana passado, era o personagem principal de uma aventura estradeira, suada, reggaeira, esfumaçada e cheia de referências cretinas e piadas que surgiam no ar poluído e cheio de poeira. A van de 16 lugares, preta, com calotas pretas e cheia de adesivos cristãos era o nosso “Caveirão”, que logo que olhei não imaginei que seria o grande protagonista da viagem insólita poeirada adentro.

A van levava, além de mim, o roadie, o jurado, o apresentador, o cinegrafista, o fotógrafo e a banda convidada para o evento que a Se Rasgum, produtora que faço parte, estava realizando em Marabá. Tudo seria banal se todos esses personagens acima não fossem todos amigos (na ordem: Ronny, Vlad, Randy, Brunno e Renato Reis) e se a banda não fosse o Juca Culatra e o Cristal Reggae - e entre eles um francês muito doido chamado Laurent. Ah, sim, esqueci dizer: tinha também o motorista garotão e sua namorada, a Tieta.

Juca Culatra em um click impaciente do Damasound
 
Com o ar-condicionado fraco, resolvemos ir de janelas abertas respirando a fumaça que vinha de dentro e de fora do carro. Mas não há nada que o bom humor e a trilha sonora não ajudem. Como a noite anterior havia sido longa para quase todo mundo que estava no Caveirão, as primeiras horas de viagem foram de cochilos e despertadas violentas com o motora freando em cima do buraco ou passando cuns caralho. “Eu abria os olhos e achava que aquela poderia ser a minha última visão desse mundo”, disse Renato. O primeiro pneu furou e paramos para consertar e iniciar a seqüência de piadas sobre refinaria de oxi no interior do Pará. Tudo era oxi. Desde os caboclos que fritavam inocentemente uma calabresa aos que passavam de moto com olhares curiosos em cima dos forasteiros.

O primeiro almoço não foi ruim. Paramos em Tailândia (infelizmente não era a mesma dos rádios relógios, guitarras vagabundas e brinquedos eletrônicos) para um belo rodízio. “Ah, tem mais de 300 km ainda para Marabá”, disse a moça do caixa. Só deu pra dar um suspiro – alguns deram uns peidos - olhar o céu e ver que ele radiava alegria no tom azul, a mesma felicidade que ainda não corria dentro do Caveirão. Naquela hora que se seguia do almoço, o violão passou de mão em mão e começou uma sessão de reggae.

E aí furou o segundo pneu. E aí que a viagem começou a ter graça. O borracheiro consertou, mas quando estava enchendo rolou o boom do estouro. Foi então que as risadas calaram, tentamos descobrir o nome do lugar, e Le se chamava Bom Remédio. Era tarde de sábado e só tinha um borracheiro de plantão e a mercearia de Dona Irce abertos. A igreja estava fechada, e todas as 30 ou 40 casas que tinham naquele lugar, perdido no meio do nada, não pareciam trazer mais vida ao lugar. Celular não pegava, o ar-condicionado também não. O motorista garotão esperou uma van passar e se mandou atrás do pneu. Tieta ficou. A gente ficou. E não tinha o que fazer, só esperar a sorte chegar do lado direito ou esquerda da estrada que margeávamos.

Cadê o padre?

Violão na mão e começa uma seqüência de axé dos anos 90. Depois que perdeu a graça – e demorou muito para acabar o repertório micareta que espetava dentro de nós, ficamos por ali, vagabundeando e ouvindo causos de gente carente. Apareceu um vampiro, um bêbado carente doido por uma roda de violão, a Bebê Adocyl, a Dona Irce e seu marido remendado, além do pergonagem principal, o psicólogo.

O psicólogo era um caminhoneiro paranaense chato pra caralho (mas que o Randy não parava de achar o sotaque dele “gostoso”). O psicólogo falava muito e não resolvia nada. Dava palpite em tudo, tirava piada sem graça, se gabava por vender, vez ou outra, uma arma contrabandeada ali pelas redondezas, e disse para a gente que era ele que transportava a madeira do ex-presidente Luis Inácio Lula da Silva. A mentira chegou ao ponto dele dizer que um policial federal não o multou depois que ouviu a voz do ex-presidente no telefone.

Três horas já se passavam e eu já olhava o céu. Se anoitecesse estávamos bem fudidos. Cheguei a parar algumas vans parta ver se nos levaria até o destino final. Falei isso para a Tieta, que calou o choro na hora e depois estendeu uma toalha amarela no volante e desandou a chorar. O Randy disse que ouviu ela dizer que tinha mais de um ano que não chorava. Tieta não foi feita da costela de Adão.

A água já tinha acabado na venda da Dona Irce e eu já estava na quinta lata de Fanta Laranja naquele calor infernal. Brunno chegou a cogitar que era só dar mais um tempo que a água chegaria. Com a desgraça instalada, não nos restava nada que não fosse rir de qualquer merda. E num daqueles momentos em que cérebro já fritou eis que chega uma van e de dentro dela sai o motorista garotão com dois pneus. Já era 17h30, estávamos salvos. Chama o borracheiro logo e vamos nessa. Como? Onde ele está? Ah, ele foi jogar bola. Sábado à tarde é sagrado para a equipe de Bom Remédio. Muito chateados por desfalcar a equipe para uma bobagem, tivemos que fazer isso e seguir viagem. Mais cinco horas de viagem e, enfim, chegamos a Marabá. 

Randy , Vlad e as melhores rabiolas do Pará

Já havia passado por uma dessas antes, mas meu destino era a cidade de Natal (Meu Deus, mas que cidade lianndaa), um puta resort e um festival legal. Nessa era mais trabalho e uma Seletiva com bandas da região que fizemos (e muito bem feito) no dia seguinte. E ainda tinha a volta... Mas quem sobreviveu ao Amargo Pesadelo à Colheita Maldita passaria por qualquer coisa.

Na volta o tempo de viagem foi quase o mesmo, pois o motorista garotão estava se cagando e parava de meia em meia hora pra batizar as louças da Belém-Brasília. Mas foi legal porque aí já estava todo mundo na merda mesmo. Mas pelo menos tinha o refrigerante Rivinho, uma tentação deliciosa de guaraná na Belém-Brasília. E como disse o bom e velho Randy, “quem não gosta de Rivinho bom sujeito não é”.

Quem bebe Rivinho vai pro céu

4 comentários:

Luly Mendonça Ishak disse...

hahahahaha "meu Deus, mas que cidade lindaaaaa". Ai...

Silviane Rocha ♫ disse...

Muitooo Bommm... essas viajens sempre são inesquecíveis!!

Anônimo disse...

ahahahaha adoreiii!

Mariana P Ortega disse...

Adorei, dei muitas risadas.