segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

Mais um Se Rasgum nos braços do independente


Um festival cheio de bons exemplos e talvez uma das edições mais complicadas de se realizar por falta de recursos. Não foi fácil colocar esse Festival em pé, mas o que eu vi rolando entre as bandas foi algo que nos inspira ainda mais a continuar. Neguinho não fica mais vendo o Festival como a salvação de sua carreira, mas como mais uma oportunidade de fazer um bom show, de estender seu público, de fazer bons contatos e de entender como se comporta o mercado da música independente nos dias de hoje. 


Foi um festival sem estrelismo, sem estresse, sem enchimento de saco. Sem grandes e sem menores. Internacionais, nacionais e locais no mesmo palco e circulando na mesma área.




E na minha opinião tem um cara que merece destaque nisso tudo, o Ben Kweller. Ele deveria dar um verdadeiro workshop de como ser independente e tirar o melhor proveito disso. O cara veio sozinho do Texas, tocou em quatro capitais brasileiras e mais Buenos Aires. Vendeu todo o seu material (vinil, CDs e camisetas) atendendo sozinho na banca antes e depois do show – tanta simpatia fez com que o material acabasse antes de chegar a Belém. Não fez NENHUMA exigência, chegou no palco e subiu com a mesma segurança de quem já tem a platéia na mão. E era só ele o violão e um piano. Depois tava lá na platéia vendo o show do Thiago Pethit. Só não aproveitou mais porque tinha que ir embora. E não estamos falando de um cara qualquer que foi descoberto um dia desses, mas de um artista que teve sua primeira banda aos 15 anos e que, nos anos 90, foi considerado uma aposta da MTV Americana, um cara que se apresentou em vários e vários festivais no mundo e que já tocou junto com bandas como o Wilco.

Além disso, tivemos a generosidade da Mallu, dos caras do Apanhador Só, Chermont e Kunz, Pethit e sua banda, Maia, Joãozin do Molho, Massa Grossa, moçada da Trip, Marcel, Enquadro, Elder, Junior, Junião, Tonny, Solano, mineirada da Pequena Morte e a roqueirada do Tokyo Savannah. Todo mundo falando a mesma lingua, apesar do sotaque e do idioma não ser o mesmo. E é exatamente a língua de quem quer ser ouvido, a da música que está gritando e que tem que sair.

O esquema é esse. Humildade e espírito coletivo. Vontade de crescer junto.

Há sete anos que começamos e estamos trabalhando com pouca grana, muita boa vontade e gente que acredita no que está acontecendo no mercado da música paraense.

A música do Pará não desabrochou do nada.

Até o VIII Festival Se Rasgum ;)

domingo, 22 de julho de 2012

Amores em páginas preto e branco



 

“No presente a mente, o corpo é diferente
E o passado é uma roupa que não nos serve mais”

Belchior


Adoro tardes de sábado de julho. Elas são perfeitas para organizar a vida de quem mora em Belém e foge da filial do inferno instalada nas praias paraenses. No sábado, obrigado pela compra de uma estante nova, resolvi rearranjar meu tesouro particular de CDs, DVDs e livros, e dei de cara com o passado, ele estava ali escondido nas páginas de livros que devorei, livros que nunca li e livros com páginas propositalmente dobradas e frases grifadas a lápis.

O hábito da leitura floresceu em mim de modo natural e sem forçar barras. Cresci me deliciando com títulos curiosos na estante que meu pai ostenta até hoje – agora em sua sala, não mais na nossa. De lá puxei alguns que serviram para formar minha personalidade e apontar para onde iria meu gosto por literatura. Li o “Vampiro de Curitiba” (Dalton Trevisan), “O apanhador nos campos de centeio” (J.D. Salinger), “Vidas secas” (Graciliano Ramos), “O Bestiário” (Julio Cortazar) e uns contos do Machado de Assis. Dessa biblioteca, surrupiei um ou outro livro de meu pai, entre eles “O santuário”, o único romance comercial de William Faulkner. Esse guardei no meio dos outros para ler mais pra frente - e naquele sábado, na foto guardada dentro dele, lembrei de quando isso aconteceu.




Empoeirados e desprezados pelos últimos anos de atenção voltada ao computador, filmes, discos e a intensidade da vida profissional, minha pilha de livros só aumentava e aquela intenção jovial de conhecer mais histórias e estilos de escrita ficou no passado. Só não tinha me dado conta que no meio daquelas páginas estavam as minhas mulheres.

Sentado e passando o pano para tirar a poeira, lembrei que alguns traziam recortes do passado. Fotos, poemas, cartas de amor, caligrafia caprichada e a emoção devolvida de uma inocência que sumiu no ar. Os livros estavam diretamente ligados aos regallos, com histórias que se cruzavam, que nos ligaram e que foram pautas de várias conversas na mesa do jantar, do bar ou de uma cama reflexiva.

Colecionei amores nas páginas dos livros que li em folhas dobradas, frases riscadas, fotos marcando diálogos, cartas de amor escondidas e poemas panacas escritos e não mandados. Talvez eu faça parte das últimas gerações que se permitem esse tipo de surpresa e emoções, a última que não deposita todos os seus bens em um HD e que, por mais que nunca dê conta de ler tudo o que compra, faz do ato de tirar poeira dos livros um momento verdadeiro que dá um sentido diferente à vida.



domingo, 27 de maio de 2012

Seis dias em Paris


O quieto e talentoso Josh Haden, do Spain
Era o primeiro dia de intenso calor em Paris. Semanas antes estava congelando a 4 graus na praia de Brighton. Eram 27 graus na capital francesa, uma cidade que não liga para ar-condicionado e para desodorante. Chegamos ao pequeno pub indie Pop In e fomos ao balcão aproveitar a última hora de happy hour a 3 euros - engraçado achar uma barbada um pint a 12 reais. Havia marcado com uma amiga francesa que havia conhecido em Belém há dois anos. Elise já estava no bar e ainda não havia a reconhecido com o cabelo um pouco maior e os trajes mais elegantes do que aqueles de andarilho europeu na Amazônia. Apresentei-a à Irema e Luana. Iuri já a conhecia também do Brasil. Ficamos por ali bebendo, conversando e suando. O motivo de eu estar ali naquele pub suando feito um filha da puta e sentindo cecê por toda parte era uma banda de Los Angeles, o Spain. Me lembro do Spain da época que fazia faculdade em Santos. Mesma época que me apeguei a sons de grupos como Mazzy Star, Red House Painters, Grant Lee Buffalo e Low.


Aquela noite de 23 de maio de 2012 foi um grande presente de aniversário que me dei. No porão da Pop In, com capacidade para 50 pessoas, mais de 70 já se amontoavam para ver a atração de abertura, um folk britânico chamado Nat Jenking, tão ruim que não sei nem com quem comparar. Antes, quando estava por ali esperando desocupar uma brecha no disputado e minúsculo lugar, esbarrei em dois garotos e uma garota franceses. Estudantes do interior estavam ali pra anotar na agenda que saíram da aula e foram ver um show indie. Caipirinhas, davam gritinhos pro cantor jeca da abertura. Não deu tempo de perguntar os nomes. Ainda bem.


Deu 10:30pm e me arrumei ali pertinho do palco pra ver. Fui empurrando um e outro até achar Iuri e Elise que estavam pertinho do ar-condicionado. Depois de mais de 30 minutos de espera – com a banda na casa esperando sabe-se lá o que – entra o Spain no palco. Assisti a uma banda que conheci, através de um amigo em Belém, chamada Spain, de Los Angeles, em Paris. Pensei na frase pro Twitter, mas desencanei.

Josh Haden é filho de Charlie Haden, um dos maiores baixistas de jazz em atividade. Com uma voz calma, que mais parece efeito de remédio controlado, Josh entra com o baixo e a banda se prepara. Muitos ali não sabiam o que esperar, tanto que na segunda música os mais afoitos deixaram o porão para espalhar cecê em outro lugar. Lançando o disco The soul of Spain, a banda controlou os ânimos com sua música extremamente calma, sussurrada e armada para ser uma sessão terapêutica de espantar o estresse. Spain é música que acalma com letras bonitas e simples. Josh Haden poderia ter seguido o caminho do pai, mas achou sua onda muito cedo e conseguiu juntar características que são possíveis de reconhecer em sua música. Achou identidade. Assisti às quase duas horas de show me deixando levar pela melodia, momentos em que o cansaço pesava e os olhos fechavam involuntariamente, não de sono, mas de entrega. Aviadei legal.


Parecia rockão, né? Pois é, não era...


Adianta eu contar que estava muito ansioso para eles tocarem uma musica chamada Every time i try e, quando pensei em gritar a música, eles começaram a tocar? Não adiante, eu sei, vai parecer mentira.



No dia seguinte, caminhando na Champs Elysée com a Camila e Luana – depois que Iuri voltou eu fiquei bendito o fruto entre as mulheres e acho que por isso gostei tanto de Paris – resolvemos entrar num cinema de rua (os cinemas de rua não acabaram na capital francesa) e assistir On the Road, a epopéia beatnik de Kerouak que ganhou uma versão de cinema quadradona com o Walter Salles. Pô, Waltinho, col foi? Não é um filme ruim, mas é bundão, para Hollywood. Mas o grande barato é que quem tocou em boa parte da trilha sonora foi Charlie Haden, o baixista fodão pai do cara ali de cima. E no terceiro dia da seqüência de coincidências entramos em uma das lojas mais completas que já conheci, a Gibert & Joseph, da Saint Martin. Eu nunca, NUNCA, havia achado um disco do Spain em loja. Ali haviam os três.



Bem, eu poderia terminar o texto falando que esperei o show acabar, fui falar com o Josh Haden, dei um pen drive da minha banda (The Baudelaires), meu cartão de contatos e fiz com que ele ficasse surpreso ao saber que tem fã na Amazônia Brasileira. Mas não, não vou terminar assim. Vou terminar dizendo que a França não se resumiu a Spain, mas a uma série de desmistificações e confirmações de tudo o que a gente ouve sobre eles. Mas isso eu vou deixar por Meu Garoto na quinta.


Sorrisão cacilds

segunda-feira, 9 de abril de 2012

The great Gal in the sky

Gal Costa aponta para o céu e interpreta, como a rainha que é, o refrão de Força estranha, do bróder Caê - e para sempre do Rei. A linda manhã de domingo no Parque da Juventude, ao lado da Estação Carandiru, em São Paulo, trazia uma cantora renovada, com outro fôlego, com doses de simpatia sem exagero e com um público de senhores, senhoras, jovens, gays e nóias, todos na palma de sua mão.

“Por isso é que eu canto, não posso parar...”, era um recado, que já havia sido dado em 1979. E entre tudo que a consagrou uma das maiores cantoras do Brasil, os anos recentes a deixaram ali, na prateleira, até vir o mano Caetano de novo e chamá-la novamente – a quem ele se refere como sua intérprete favorita, cagando e andando pra irmã Bethânia. Veio Recanto, disco recém-lançado que foi um tremendo insight de produtor, trazendo uma carga de renovação ao canto feminino ainda vivo mais verdadeiro desse país.


Tô aqui, Gal! Lheeenda!

O palco de fundo vazado, sem a iluminação de um show noturno, trazia uma Gal Costa serena, sentada em um banco e acompanhada de uma banda nova, composta por Domenico Lancelloti, Pedro Baby (o orgulho do Pepeu) e Bruno Di Lulo. O começo do show já traz a belíssima Recanto escuro, faixa de abertura do último disco, elogiado e listado entre os melhores de 2011: “Não salto mas sou carregada por asas que a gente não tem. A luz não me fulmina os olhos, nem vejo bem”.  E então depois da abertura MPB, o roadie vem e afasta o banquinho. E então Gal mostra que é a mãe do rock.

Que Rita Lee que nada. A ousadia rock ‘n’ roll está em trocar de estilo, se reinventar, acrescentar noise, solos de guitarra, groove box e acordes sombrios. Teve Neguinho, Vapor barato, Miami maculelê e a estranhíssima Cara do mundo. E claro que não faltou Folhetim, Me bem meu mal e uma bela tirada de onda com Um dia de domingo, em que ela fazia um dueto seu com uma imitação (sua) de Tim Maia.

Cool jazz me faz feliz e só, não tenho jeito

Depois que uma nova geração apareceu mostrando um sopro de originalidade e renovação na música brasileira, como Tulipa Ruiz e Céu, a veterana Gal retomou a parada e mostrou que é tão foda quanto. Isso, é claro, com uma ajudinha de Caetano, Moreno e Kassin.

Vim a São Paulo exclusivamente para o Lollapalooza, mas Gal me roubou a atenção. Assistir a shows inesquecíveis como Thievery Corporation, Gogol Bordelo, Band of Horses, TV On The Radio e Jane’s Addiction. Mas minha promessa nesse blog é só escrever sobre algo que realmente me causou algo relevante. E Gal Costa tocou fundo.



quarta-feira, 28 de março de 2012

Desculpa, perdi a memória


- Alô.
- Alô.
- Quem é?
- Tu que ligou, pô. Quer falar com quem?
- Não sei.
- Como é que é?
- Quem tá falando?
- Marcelo.
- Ahn... mas o que é aí?
- Aqui é residência, minha tia. Minha casa!
- Mas residência de quem?
- Da Dona Sandra, porra! Minha mãe! Dona Sandra! Tá bom?
- Ah tá...
- E com quem a senhora quer falar afinal?
- Não sei, eu esqueci.
- Mas ora caralho...
- Eu heim, tu não tem paciência, né? Fala muito palavrão.
- Tô fudido...
- Tá vendo?
- Tchau!
- Tchau..

sábado, 24 de março de 2012

Tenho uma coisa pra falar

A comédia é algo fundamental na minha vida. Preciso dela para acordar, trabalhar, viver com uma mulher, reunir com meus amigos, escrever, criar e continuar respirando. Para alguns é algo para se desligar do mundo. Pra mim é o que conecta. E a morte de Chico Anysio realmente abalou. Pra mim – e talvez para toda a minha geração - foi como perder um avô. Cresci com ele dentro de casa todas as semanas, em momentos marcantes com meus pais na sala de casa rindo pra caralho.

Não to querendo homenagear o cara e nem “compartilhar a minha dor”. Mas é foda saber que todo vez que morre um humorista o mundo fica mais sem graça. E aí quando se perde um gênio o mundo fica mais burro. Até surgir um novo Chico Anysio tem que nascer e morrer muitos Rafinhas Bastos.

Tem esse vídeo aqui que já foi badalado pra cacete e que tem o carimbo da porra da Rede Globo. Mas enfim, não custa compartilhar:

 

sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

Na mesa do fundo



Chegaram quase na mesma hora. Ele gostou do cabelo dela. Ela o achou mais bonito. Ele fez questão de estar bonito. Deixaram as chaves dos carros nas mãos dos manobristas e aguardaram na ante-sala próxima ao balcão da recepção. Escolheram aquela mesa no fundo do bar para evitar cumprimentos sem graça aos fãs e paga-paus de plantão. Ele veio de uma temporada de sucesso no exterior e ela sustentava o mesmo glamour de televisão dos últimos oito anos.

- Que engraçado a gente vir nesse bar. Aliás, seu cabelo está melhor assim, curto.
- Obrigada. Quanto ao bar, escolhi de propósito.
- Ué... qual propósito?
- Bem, esse cenário é a nossa cara, a nossa história.
- Pois é, essa é a questão. Que história?
- Porra, vamos começar assim essa conversa?
- Não, não. Desculpa. É que quando você mandou aquela mensagem falando para a gente se encontrar, achei que era algo mais casual, mais “e ai, quais as novidades?”.
- Bem, era pra isso sim. Só queria estar em um lugar que tivesse mais a ver com a gente.
- Tudo bem, coisa de mulher.
- Pois é, coisa de mulher. E então, e como está esse sucesso todo na Europa?
- Bem, as revistas brasileiras exageram.Você sabe muito bem como funciona.
- É, eu sei. Mas aqui só se falava no teu sucesso na Europa. Os jornais estavam viciados no teu nome.
- É, minha assessora me manda todas essas notícias.
- Ahn... assessora. Ainda é aquela moça?
- Sim, é ela. Não precisa mais se referir a ela como “aquela moça”, né? Já passou tanto tempo.
- Mas eu sabia que estava certa.
- E você sabe que aquilo não significou nada.
- Pode não ter significado, mas é que ela foi a primeira depois de mim.
- Eu sabia que você sentiria ciúmes. Devo admitir que eu sabia que isso te incomodaria.
- Ah é? E contratou ela só pra me fazer ciúmes?
- Claro que não, né? Essa tua mania de se dar mais importância do que tem. Eu estava precisando de uma assessora na época e ela estava desempregada.
- Mas depois você foi lá e comeu ela.
- Ah, mas foi uma vez só, coisa de bêbado.
- Duvido!
- Mas ora ora. Que porra de cobrança é essa? Esqueceu do que tu fizeste pra mim?
- Lá vai. De novo isso?
- Claro! Parece que tu esqueceste, né?
- Não, eu não esqueci e já te pedi desculpas.
- Eu fazendo aquele papel de palhaço indo te encontrar naquele hotel.
- Caralho, eu te disse! Estava em um momento muito confuso da minha vida.
- Sabia que fiquei um bom tempo odiando hotel na frente da praia?
- Que bobagem.
- Bobagem? Bobagem? Eu ficava esperando o interfone anunciar a tua chegada. Esperava três batidas na porta, abrir e te ver. Mas fiquei ali, consumindo todo o álcool daquele frigobar e atirando garrafinhas de dose única no mar. Até o sol eu odiei!
- Credo. Se eu soubesse que iria escutar isso tudo de novo não teria mais te chamado.
- É claro, é porque você detesta se confrontar com seus erros e ter que admitir!
- O que mais tu queres que eu faça? Já pedi desculpas. Te chamei pra gente conversar. Porra, será que tu nunca vais superar isso?
- A merda é que depois de ti demorou muito para eu me recuperar.
- É? Pois pareceu que superou rápido!
- Na verdade superar foi fácil porque a decepção foi grande.
- Eu sei.
- Depois de ti eu não me apaixonei por mais ninguém. Saia com umas mulheres sem pedigree, gente desclassificada. O ano que se seguiu depois daquilo foi terrível.

Duas garotas interrompem a conversa. Perto delas, um menino abicharado segura uma máquina fotográfica digital para tirar uma foto delas com o casal. Eles, esbanjando a educação que o celebritismo os deu, sorriram como se aquela fosse a tarde mais feliz do mundo. Pediram até para ver a foto. Na hora, os dois constataram que aquela vida de sorrisos, abraços e etiqueta era uma farsa. Seus sorrisos nunca denunciariam que aquela conversa estava carregada de emoções ruins.

- Se isso for para a internet eu to fudido.
- Porque, é tão ruim assim ser visto comigo?
- Não, mas meus amigos e, principalmente, a minha namorada não vai gostar de saber que eu te encontrei.
- Ah, tens uma namorada?
- Sim, tenho. Mas ela não mora aqui.
- Eu não sabia disso.
- E porque precisava saber?
- É, tem razão.
- E teu casamento, como está?
- Tá indo bem. A gente se diverte muito.
- Legal... porque será que eu não acredito nisso?
- Porque te faz bem achar que estou na merda.
- Ou porque eu sei que você cria verdades para estar por cima?
- É, já chega. Parei. Vamos pedir a conta.
- Não precisa esperar a conta. Pode ir, eu pago.
- De jeito nenhum quem vai pagar sou eu.
- Beleza, vamos disputar agora quem é mais cortês.
- ...
- ...
- O tempo não apaga mesmo, né?
- Apagar não apaga. Foi um furacão que me arrastou pra bem longe, mas deixou cicatrizes.
- Adoro as tuas metáforas.
- É meu ganha-pão.

Riram.

- Será que a gente pode começar essa conversa de novo?
- Pode sim.
- Mas você ainda vai continuar jogando coisas na minha cara

Ele pensou em sacanagem, mas respondeu sério.

- Não, não vou. Desculpa.
- Tá, tudo bem, desculpo.
- Caralho...
- O que foi?
- Lá estou eu pedindo desculpas por uma coisa que tu provocaste.
- Pronto, tudo de novo.
- Não, beleza. Esquece...
- Tá, vamos recomeçar.
- Tá, vamos pedir a carta de vinhos.
- Humn, é um entendedor de vinhos agora, chique!
- Pelo amor de Deus, “chique” é expressão de puta pobre.
- Esse teu humor... se eu não te conhecesse bem acharia que isso é pra mim.
- É, mas você conhece. Na verdade, é bom estar perto de alguém te conhece bem. Faz tempo que não tenho isso.
- Tá ouvindo o que está tocando agora?
- Sim. Está naquela fita que gravei, né? Que bom saber que músicas cafonas te fazem lembrar de mim.
- Pelos menos elas tem uma função positiva.
- O poder da música pop.
- Lembro sempre que escuto ...
- Sempre?
- Sempre.
- Eu lembrei de você outro dia também, quando deixei a janela aberta.
- Ele entrou de novo?
- Entrou.
- Não esqueço desse dia. Foi uma surpresa quando ele entrou, ficou ali olhando pra gente e viu tudo.
- E depois voou...
- É, depois voou.

terça-feira, 10 de janeiro de 2012

O jardim de Tulipa

Entrevista que fiz com a Tulipa Ruiz exclusivamente para a revista Leal Moreira (ex-Living), de Belém.











O jardim de Tulipa

Tulipa Ruiz, uma das maiores revelações da nova música brasileira revela suas inspirações, preferências e sobre sua recente e já consagrada carreira musical

Houve um momento em que a música pop brasileira se perdeu. Rompeu muitas barreiras e correu atrás de tanto prestígio e dinheiro que acabou criando subprodutos cada vez mais repetitivos e com suas fórmulas esgotadas. Mas como toda a categoria musical se reinventa e floresce com uma bela novidade, no jardim da música pop nasceu uma Tulipa.

No coração da grande metrópole das novidades, em que tendências e propostas musicais que se perdem dentro de tanto conceito, a simplicidade, leveza e o pop bem dosado da cantora paulistana Tulipa Ruiz conquistou o Brasil em um curto espaço de tempo que se tornou a grande promessa pop dos últimos anos. Na TV, rádios, blogs, revistas especializadas, Ipods e mp3 players de cada canto do Brasil a voz doce da cantora santista emanou a poesia cantada de seu disco de estréia “Efêmera”, produzido por Gustavo Ruiz, seu irmão, e com composições e parcerias de outro integrante da banda, seu pai Luiz Chagas. Tulipa chegou com sua família. Luiz era guitarrista da banda Isca de Polícia, a banda de Itamar Assumpção, e foi um dos grandes responsáveis pela educação musical de Tulipa, como ela revela na entrevista exclusiva à revista Leal Moreira durante sua passagem por Belém, no projeto Se Rasgum Apresenta, no Círio de Nazaré.

Um show chamado “Novos Paulistas” uniu Tulipa a outros novos nomes consagradas do cenário musical da capital paulista, como Thiago Petit, Tiê, Dudu Tsuda e Tatá Aeroplano (os dois últimos da banda Cérebro Eletrônico), para um show especial no Sesc Vila Mariana. Mas foi junto a outro nome dessa turma que ela começou a se aventurar e investir em dua carreira musical. Marcelo Jeneci, que também vem colhendo belos frutos de seu trabalho de estréia, o disco “Feito pra acabar”, surgiu no mesmo e estúdio e cercado dos mesmos amigos, tanto que Jeneci e Tulipa fizeram diversos shows juntos e tem músicas compostas em parceria. Gustavo Ruiz, guitarrista de Tulipa, foi quem produziu os discos de estréia dos dois artistas.

Com mais de 10 mil cópias vendidas apenas no circuito independente de shows, a cantora, seu irmão e o pai preparam o novo disco, que será lançado no ano que vem. Enquanto isso, Tulipa aproveita e faz seus shows arrebatadores de simpatia e sutilezas, contagiando com seu carisma e uma sensualidade ímpar em cima do palco. Em pouco mais de um ano ela já coleciona coisas como Rock in Rio, Jô Soares, os maiores festivais independentes do país, apresentações internacionais, jogo de vídeo game e até prêmio de melhor cantora pelo canal de TV fechado Multishow.

A leveza de Tulipa se reflete no que ela canta, em temas leves, cotidianos e em canções cheias de arranjos simples e bonitos. Canções que falam sobre passarinhos, bordados, tardes de domingo, sessões de cinema, canções de amor que não falam de amor e rotinas de um músico por São Paulo. Temas simples em canções doces, mas que não soam bobas e encantam pela verdade. E é sobre isso que a cantora revela novidades, inspirações, preferências, comparações e sobre a arte de ser simples.


1 - Mesmo vindo de um berço musical você optou por outro começo de carreira, como jornalista. O lance de artista frustrado virar jornalista foi exatamente o oposto com você?
Acho que não, porque sou filha de jornalista-guitarrista. Na minha cabeça meu pai sempre "escreveu e tocou", nunca separei muito as duas funções. Sempre gostei de escrever, desenhar e cantar, gosto de exercitar cada uma dessas coisas. Não optei por começar como jornalista, aconteceu, assim como a música.

2 – Suas primeiras experiências musicais sempre foram entre família?
Cresci ouvindo os discos do meu pai, vendo minha mãe cantar e meu irmão descobrir o violão. A experiência com a música sempre foi estimulada dentro de casa e fazia parte do nosso cotidiano. Acordar, escovar os dentes, ferver água, colocar um disco, tomar café. Achava estranho um lugar sem violão. Comecei a cantar em casa, com o Gustavo, e até hoje a gente faz música junto.

3 – Li em alguma matéria uma comparação sua como uma mistura de Gal Costa com Bjork. O que acha dessa observação?
Achei divertido. Mesmo se não fosse eu ficaria curiosa em saber quem era a cantora que "mistura de Gal com Bjork". Que combinação maluca e interessante, né? Entendo e não me assusto com a necessidade que as pessoas têm em fazer comparações, é natural. É uma necessidade de decupar o outro para poder entendê-lo. Só que as vezes as comparações viram cruzamentos gozados, como esse. E eu só me divirto.

4 – Quais os cinco discos que você definiria como os mais influentes para a decisão de se tornar uma cantora?
Pode ser seis? “Court and Spark”, da Joni Mitchell, ‘Rumo aos Antigos”, do Grupo Rumo, “Wild Life”, do Wings, “Cantar”, da Gal, “Feminina”, da Joyce e “O que vier eu traço”, da Baby Consuelo.

5 – O segredo é ser leve e sincera?
Acho que o segredo é curtir, no sentido de degustar, de estar muito presente no que está sendo cantado, tocado e falado. E compartilhar isso tudo com que está assistindo.

6 - Em que categoria musical você se encaixaria? Novos paulistas?
Não, Novos Paulistas nem é uma categoria musical, é apenas o nome de um show que aconteceu duas vezes em São Paulo. Prefiro chamar de "Música Popular feita no Brasil de Agora". Às vezes chamo de Pop Florestal, mas é mais uma brincadeira exatamente sobre essa necessidade de catalogar uma música. Quando a gente sai do Brasil, vira World Music. Aqui chamam de Pop, Rock, MPB, Indie. Esses dias disseram que sou samba-rock. Achei estranho, mas depois entendi que gênero musical de um artista é uma coisa absolutamente mutante.

7 – Você passou poucas horas em Belém, mas viveu uma experiência que, aos olhos do público, pareceu verdadeiramente intensa. Existem lugares em que se sente um astral diferente ou sua música e a simpatia proporcionam isso?
Sim, existem lugares em que você sente o astral diferente. Tem lugares mais quentes, outros nem tanto. Em Belém as pessoas estavam com vontade de desfrutar o show. Foi um público muito intenso e generoso. Cantaram todas as músicas. Isso aquece o show, energiza. É uma troca, né?

8 – Como tem sido a experiência no exterior?
Tem sido ótima! O disco foi lançado na Europa e na Argentina e a música Efêmera saiu no game Fifa 11, o que ajudou bastante a não ficarmos limitados aos termos" MPB" ou "World Music". Passamos por Paris, Lisboa, Itália, Londres, Washington, Nova York e Buenos Aires. Em alguns lugares as pessoas cantam as músicas, como em Paris e Buenos Aires. Já em Lisboa o público é atento, porque a língua nos aproxima demais. As entrevistas sempre são fluidas, com perguntas interessantes. Em Londres a gente ganhou uma crítica super positiva do "The Guardian". Então aos poucos, tenho conseguido viajar com a banda para lugares novos e temos sido bem recebidos. É tão legal sair do Brasil com música e ver a recepção das pessoas.

9 – O primeiro disco “Efêmera” é uma coleção de hits, que nasceu de um momento muito espontâneo do surgimento de sua carreira, junto com o Marcelo Jeneci. Você teme uma certa pressão para que o segundo álbum soe tão natural quanto o primeiro?
Quando fui gravar a música Efêmera, chamei a Céu para fazer côro, ao lado da Anelis Assumpção e da Thalma de Freitas. A Céu chegou primeiro e começamos a conversar sobre a grande maratona que é fazer um disco. No final ela me disse" No segundo disco você vai se divertir muito mais!" Isso ficou na minha cabeça de um jeito bom. Estou cheia de vontade de gravar coisas frescas, que eu já inventei ou ainda vou inventar. Claro que as pessoas tem expectativa sobre o meu próximo trabalho. Mas isso não me pressiona, posso dizer até que me estimula. E que venha o próximo disco!

10 – Se pudesse ser bem sucedida em outra profissão na vida, seria o que?
Cientista. Queria ter um laboratório para ficar manipulando coisas coloridas dentro de tubos de ensaios, descobrindo curas para milhares de coisas.