sábado, 31 de dezembro de 2011

2012, te vejo no Meu Garoto



Sem mais softcore no Maxprime na tentativa meia sola de emoções na madruga. É quando constato um desanimo, não exatamente ligado ao fracasso, numa forma de não conseguir ajustar o desejo à preguiça. Tenho essa obsessão pela letargia e acho do caralho me entregar à arte do nada e todos os seus segmentos. 2011 foi um ano bom, um ano em que ampliei meus horizontes geográficos, fiz contatos importantes e em relação à realização profissional espero ter sido o primeiro ano do resto da minha vida.

E por mais que tenha acordado algumas manhãs, olhado para o teto e assistido em flashes os desastres ou orgulhos da noite anterior, a vida seguiu macia, sem contornos proibidos e paradas suspeitas com mãos na cabeça. Suave, suave. Se a saúde deixar eu vou longe, mas daí vem a lembrança do Randy falando do compositor cubano Compay Segundo e seus 100 anos de pulmão negro.

O legal de fazer esse balanço é perceber que desci alguns degraus da escadaria loser. Foram quatro viagens internacionais, outras muitas estaduais, entrei para uma banda que eu era fã e trabalhei para caralho. Não curto a idéia de promessas para o próximo ano. Acho que as coisas que precisam ser mudadas elas são mudadas de imediato, na base da ruptura bruta, sem planos e sem estender prazos para o vício. O foda é a vida solteira que te joga num mar de opções mundanas em que copos com a grafia do seu nome se tornam status. Valeu, Antônio!

Não sei o que fazer em relação à coca-cola, mas enfim, chega de desabafo pessoal. O fato é que 2011 foi um ano muito foda, e espero que ele determine os que se seguirão. Na escala de conquista estão 20 quilos a menos, mais tatuagens, um carro menos vovó e mais viagens, shows, música e projetos culturais realizados pela Se Rasgum, rumo à candidatura de Gustavo Rodrigues, em 2022.

Fala a real, eu to expulsando todos os possíveis novos leitores desse blog com a ausência de atualizações e com a enxurrada de piadas internas, né? O foda é que o Facebook e Twitter comprimiram tanto a necessidade de se dizer algo em poucas palavras, que o texto teve sua função diminuída. Taí uma promessa boa para 2012: mais textos, mais leituras, diminuir a pilha de livros e quadrinhos que se acumulam na minha estante. Bem, seria legal também novas prateleiras, mais CDs, menos quilos, um carro selvagem, tatuagens selvagens, concentração e muita vontade de trabalhar. Mas eu disse que não gostava de promessas para o próximo ano, certo?

Confia em mim, 2012 vai ser da pesada.


Tem que ter um som legal, tem que ter gente legal e ter cerveja barata
(Da dir. à esq.: Junhinho, Vlad, Yo, Adriano, Antônio e Spencer)

segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

Desculpe as flores que eu deixei

De lá de cima, na pequena ponte que permite a passagem de um lado para o outro do salão principal do Hangar, eu e Gustavo olhávamos ao início do show da banda local Vinil Laranja na noite de domingo. Naquele momento comentei com ele: “esse deve ser o último, eu realmente cansei”. Dias depois ele me lembrou disso e falou que sentiu que naquela hora eu realmente estava abandonando o navio. Era o terceiro dia da sexta edição do Festival Se Rasgum, aquele pelo qual sou odiado, adorado, invejado, incentivado, mal tratado, simpatizado e antipatizado no meio musical de Belém. Gustavo havia tomado a mesma decisão dois anos antes, assim como Marcel. Eu ainda não conseguia me livrar do vício.

To vendo o ano chegar ao fim e me deparando mais uma vez com as escolhas que fiz, questionando o sentido de tudo isso e onde é que essa porra vai dar. A amargura dessas primeiras linhas confessionais - que todo ano relato após a experiência de ser um dos protagonistas do Festival Se Rasgum - são embaladas pelo cansaço, pela falta de paciência com o mesmo nhem nhem nhem de sempre e, confesso, pela paixão. Ô amor de puta.

Andando pela feira que ligava um palco ao outro encontrei com Totonho, o cabra. Ele era uma das minhas grandes apostas para esta edição. Assisti a um show uma vez em uma festinha no carnaval no Recife, uma apresentação realmente visceral, direta e rica em timbres, sotaques e referências. O show, lá em Recife, acabou com “Carimbó do macaco”, do mago Pinduca. Trocamos uns emails engraçados. E lá estava Totonho, finalmente falando comigo, depois de um show que me encheu de orgulho.

Totonho foi um dos que fez a coisa toda a valer a pena 

Por ali passavam uns garotos de 14 e 15 anos que conheci naquela semana, antes de um show da banda que agora faço parte, The Baudelaires. Na ocasião, eles me perguntaram se conseguiriam ver o Lobão, e disse que sim, mas com autorização e um responsável acompanhando. Falaram felizes que a mãe de um deles estava lá acompanhando o pequeno bando. Todos estavam com o CD de Totonho e pediram autógrafos e fotos. Os moleques foram ver Lobão e saíram dali fãs de Totonho. Me abraçaram e pularam de felicidade quando eu disse que, semanas depois, teria show dos Móveis Coloniais de Acaju. Só moleque bom! Foi naquele momento eu finalmente senti um puta orgulho de tudo isso e mandei aquele sentimento escroto pra casa do caralho.

Os picos de alegria e melancolia se alternavam como se fosse uma patologia, mas era a montanha russa de sentimentos bipolares. Ver o Antcorpus ali com aquele visual trash metal dos anos 80 botando pra fuder, mesmo sendo a primeira banda do domingo, me fez dar um grito de lá de trás, achando aquilo a visão mais bonita do Festival. Uma banda de trash metal do interior do estado fazendo um show com todo o tesão que uma banda de rock precisa ter. Acabou o tesão, acabou o amor, malandro. É assim que se faz.

Antcorpus no Se Rasgum de 2011. Mostra como é que se faz.

E na sexta-feira, primeiro dia do evento, eu e Dudu Feijó (outro Se Rasgum que tomou a decisão sensata de cuidar da sua vida) estávamos atrás da housemix esperando pelo show eletrizante do Bidê ou Balde. Ele comentava do show anteiror, do Leoni, falando que aquele sim era um grande songwritter brasileiro. E que fusão legal que foi seu show com o Suzana Flag. Joel, Suzane e Ricardo mereciam isso. Trazer o Leoni foi uma das coisas mais legais que pude fazer nos últimos anos.

Aquela questão do songwritter ficou na minha cabeça. E listei, de imediato, Marcelo Jeneci, Lobão, Leoni, Fábio Trummer e Laurentino. Esses caras estão ficando raros. Como a música pop se realimenta de propostas (financeiras e estéticas) e acaba deixando os grandes compositores de lado. Marcelo Jeneci - o show que emocionou todo mundo no encerramento do 6º Festival Se Rasgum – trouxe de volta isso, a composição que deixa um legado para a música pop, coisa que raríssimos artistas tem a manha de fazer hoje em dia.

Marcelo Jeneci encerrou a sexta edição cutucando corações


E se compositor tá virando artigo raro, minhas lágrimas assistindo em casa a apresentação de Laurentino e Os Cascudos foram muito reais. Laurentino merece muito mais do que eu quero falar nesse post. A vitalidade que ele demonstra no palco sempre me comoveu, mas dessa vez senti um certo ar de cansaço e isso me preocupou. São 87 anos de uma vida de caboclo, tocando gaita, compondo roques e dançando magistralmente.

Laurentino, o maior compositor paraense de rock



Leoni foi o primeiro a mostrar canções

Lobão e seu show de 50 anos a mil

Depois da queda, veio um coice e depois mais uma queda. Uma virose que pegou de jeito, me deixou no aconchego de uma febre com direito a filmes, discos, visitas e uma reflexão muito serena sobre o que fazer com a minha vida. Esta edição foi, sem sombra de duvidas, a que mais balançou as estruturas, que teve um belo upgrade, mas que mexeu com quem estava calado, que provocou o underground e que serviu para me apresentar pessoas que eu ignorava a existência, mas que agora sei que existem por se incomodar comigo. Uma frase da minha sócia Renée Chalu sintetizava tudo e me acalmava: “se está rolando todo esse incômodo e críticas é porque o Festival é grande”. E é exatamente isso. As pessoas esperam que o Se Rasgum realize seus sonhos pessoais, já que a internet potencializou o grito dos solitários. Mas para mim, o resultado mesmo são os molequinhos que foram com a mãe, que ficaram fãs de Totonho e Os Cabra e El Cuarteto de Nos e que, na malacagem, ainda conseguiram entrevistar o Lobão para um trabalho na escola.


E é por essas e outras que eu viro mulher de malandro.

Até o ano que vem.

sexta-feira, 14 de outubro de 2011

La porra de las gafas de sol




Pensei em dar um novo rumo à minha vida depois que me deparei com esses dois cartazes trazendo esse line up para Valência e Madrid, apenas uma semana antes da minha ida para a Espanha. Imaginei minha vida trabalhando em um pequeno festival como esse, que não deve reunir mais de 500 pagantes, colocando as bandas dos sonhos e sendo feliz assim na Europa. Já tenho um plano B para se nada mais der certo nessa vida.

Acho que a melhor coisa de Barcelona foram as lojas de disco. Em uma das noites em que seguia a indicação de uma amiga para beber em uma caverna no centro da cidade, chamada Ovelha Negra, vi algumas lojas de disco – já fechadas – e marquei aquela rua para voltar no dia seguinte. Meu deleite durou horas e tinha vontade de gritar “QUE LOJA FODA!” quando ia descobrindo salas e mais salas dentro das lojas de discos naquela rua. A mochila voltou pesada. A melhor surpresa foi quando voltava de metrô, depois de me perder de um compromisso com uma amiga, achei uma loja de discos perdida no meio da estação. Enorme. Lá, só discos, DVDs e jogos de vídeo game de segunda mão.

Mas enfim, vamos à segunda parte da jornada catalã.



Barcelona – Parte 2

Tentei lembrar como era “óculos escuros” em castelhano. Na loja enorme, fedorenta e com um péssimo astral havia dois chinas trabalhando e uma mulher bizarra como cliente. Tentei no inglês “Do you have sunglasses?”. E o china fazendo gesto de que não entendia. “Dark glasses!”. No, no compriendo. Fiz gestos e nada do chinês entender. Até que avistei uma estante com alguns e perguntei para ele como se chamava aquilo em castelhano. Perguntei em inglês e espanhol. E nada do china responder. Só fazia gestos de que não estava entendendo. Sai esbravejando em português: “Filha da puta do chinês quer ganhar o mundo e não fala uma porra dum inglês e nem um espanhol!”. Dia de fúria em Barcelona.

Barcelona e suas hippongas lindas e fedorentas
 
No meu nono dia por ali a vontade de voltar para casa já havia apitado algumas vezes, tanto que no dia do meu retorno acordei cedo, tomei um café da manhã demorado e fui andando para a estação Sants. Lá, perguntei onde pegava o trem que ia ao aeroporto. Era a linha 9, a mesma que passava outro trem que levava para o litoral do sul da França. E no vagão que eu estava todo mundo falando francês, com cara de francês e roupa de praia. Tinha um cara que parecia o Sean Penn. Não era ele. Se fosse acho que também estaria no trem errado.

Tudo o que me restou foi tirar fotos do literal no trem errado

Fui bater quase na França, voltei, peguei taxi, perdi o vôo, desembolsei muitos euros pra remarcar a passagem para o outro dia. E tinha o hotel ainda. Dois eventos que estavam começando naquela sexta-feira tomaram conta de Barcelona. No hotel que estava não havia mais vaga. Nos dois outros mais próximos de lá idem. Achei um quarto em um hotel quatro estrelas que era o mais acessível. Mais euros.

Mesmo que minha ida tenha sido marcada por um rombo no orçamento e um ou outro aborrecimento, a capital catalã, assim como a cidadela de Vic, carimbaram uma excelente impressão da Espanha, com suas mulheres lindas, shorts pequenos, cecê no metrô, educação restrita e sem sorrisos e ótimas lojas de discos.


P.S: que post preguiçoso e protocolar, heim? Só pra constar que ainda atualizo o blog. Atraso mas dou as caras, nem sempre com a mesma empolgação. A tensão pré festival me consome, me tira o sono, a inspiração e a vontade de viver. A merda é que eu adoro isso.

sábado, 24 de setembro de 2011

A música viva de Vic


 
Henrique, um jornalista de Guadalajara, nos falava sobre as drogas do México e de como ele apresentou o Arnaldo Antunes ao Rubem Fonseca em uma feira de livros que ele produz no México. Éramos oito pessoas e havia apenas um carro na saída da Capa Atlântica, onde acabáramos de assistir ao que pode ter sido o melhor e mais surpreendente show da 23 Mercat Música Viva de Vic. Na hora de dividir que iria no carro, eu, Talles e Fernando, um espanhol que nos foi apresentado naquele momento, optamos por ir andando até o outro palco, que ficava há bons 30 minutos andando dali. 

Nas ruas de Vic
 
No caminho, o espanhol nos falava de seu trabalho com distribuição e lançamento de artistas internacionais em terras espanholas. Era dele a distribuição de discos dos Arctic Monkeys, Radiohead e alguns outros nomes não tão indies. Fumando cigarros, passamos em frente ao Jazz Cavas, um dos palcos do festival, que era um pub e uma caverna pequena. Ele viu a programação e disse que achava que aquela banda que estava tocando na hora já havia trabalhado com ele em um outro momento junto com o produtor Steve Albini. A referência era boa, mas optamos por terminar op cigarro e esperá-lo do lado de fora tomando uma cerveja e vendo as muié. Pensamos até em deixar o cara lá, mas aí já seria muita sacanagem. Ele sai e nos diz que a apresentação estava fantástico, e entramos para acompanhá-lo. Só que a surpresa nos tomou de assalto. A dupla era um guitarrista que, naquele momento era ajudado por um rapaz da técnica a colar sua correia com silvertape para que o show continuasse. Vimos quatro músicas. Um baterista vigoroso e um guitarrista barulhento. A dupla se chama Atleta, e é de Barcelona. E aquilo deu um gás tão grande que saímos do Jazz Cavas empolgados fazendo comparações com o Mogwai, só que minimalista e mais enérgico.

A dupla Atleta apavorava na cave experimental
 
Esse foi apenas uma das surpresas que o evento separava para nós que, além de termos a oportunidade de conhecer uma cidade de 30 mil habitantes e tipicamente catalã. Participamos de uma rodada de negócios em que ótimas coisas foram amarradas, com bandas que podem, em breve, dar suas caras aqui. Vou fazer um pequeno resumo dos grupos que mais me chamaram a atenção:

Russian Red
 
Russian Red (Espanha): Era indicação que já haviam me dado na rodada de negócios. O show me surpreendeu pelo charme indie e pela ótima banda que a acompanhava. Achei um pouco de Mazzy Star, só que mais pra cima. Depois, tomando uma cerveja com os produtores de Russian Red, eles me disseram que ela fazia cover de Fade into you, do Mazzy Star, que é muito fã de Mallu Magalhães e que seu disco foi gravado tendo ninguém menos que o Belle & Sebastian de banda de apoio.


Santa Macairo Orkestar
  
Santa Macario Orkestar (França): Acho que em questão de show, de performance ao vivo, o Santa Macairo Oskestar foi o melhor que vi na Espanha. O grupo que tem em sua formação bateria, baixo, piano, trombone, violino, trompete e sax. No som uma mistura de ska, sons balcânicos, fanfarra elétrica, blues de New Orleans e punk - muito mais na atitude, pois a banda não tem nem guitarra. Ao vivo a simpatia e naturalidade dos músicos me lembrou os amigos dos Móveis Coloniais de Acaju, mas ainda melhor.


La iaia
 
La iaia (Espanha): A produtora havia falado comigo naquela tarde e defendeu o som da banda como um Beirut menor. Não gosto do Beirut, mas como ela era uma gata fui ao show. No palco eram três garotos que trocavam de instrumentos entre violões, baixo elétrico, teclados, instrumentos percussivos etc. Teve uma hora que me pareceu uma versão de Blue Monday, do New Order, mas em uma execução folk atípica.


Puerquerama
 
Puerquerama (México): Foi aquele tipo de show que quando vi de longe rolando me aproximei para saber que diabos era aquilo. Seis caras feitos vestidos de vermelho (uns com máscaras de porco) tocando um punk mexicano sem concessões. Os três vocalistas sem camisa. Todos feios. Foi um dos poucos shows que eu vi a moçada pedindo bis e eles voltando ao palco. Se despediram com uma versão de Lust for Life, do Iggy Pop, em bom castellano e ganhando uma salva de aplausos e gritos da platéia depois que um deles soltou um “independenzia a Catallynia!”.

Atleta

Atleta (Espanha): Essa dupla foi a surpresa perdida no meio das vielas de Vic. Um guitarrista cheio de seus efeitos de pedais. Um baterista fora de série. O som tinha ecos de Sonic Youth, Mogwai e várias experimentações noises e post rock. A Atleta está embalada para viagem. São só duas pessoas e muita energia rock.


Los Delincuentes & Tomasito

Los Delincuentes & Tomasito (Espanha): Fui um show para mais de 10 mil pessoas na Plaça Maior, onde aconteciam os shows mais populares abertos ao público. Foi lá que vi Russian Red e La Iaia. E lá que vi também a apresentação de Los Delincuentes & Tomasito. Los Delinquentes são uns seis ou sete caras nos violões e percussões que entoam uma espécie de rumba e tango, mas o tal do Tomasito botava pra fuder. Uma menia à tarde havia me dito que ele era uma espécie de Michael Jackson espanhol. Ela se referiu às danças que, na verdade, não tinham nada a ver com o finado ídolo pop, mas eram engraçadas e levavam o povo a loucura.




quarta-feira, 14 de setembro de 2011

Olhe ao redor, tá tudo engarrafado

Olhei minha passagem e meu lugar era 26 J. Perguntei pro cara do check in e ele confirmou que era janela sim. Era janela sim, mas todos os outros números, menos o 26, que nesse caso era o que dividia uma sessão de outra dentro do avião. Sabe aquela excessão? Sentei nela. E aí que ficava ao menos no corredor. O velho francês quando me viu pediu para a aeromoça mudar ele de lugar, pois ele tinha “fobia” a sentar no meião. A aeromoça me pediu. Neguei categoricamente. Sentou uma moça de Castanhal ao meu lado. Gente fina, estava indo passar três meses com a prima em Frankfurt. Fora as cotoveladas que ela me dava tentando se ajeitar na desajeitada poltrona foi uma viagem tranqüila. Mas vamos lá, não estou aqui para reclamar da sorte. As coisas estão bem legais e eu cortei o cabelo e estou bem bonito.

No aeroporto de Lisboa encontro o Benjamin Taubkin, que graças às suas experiências anteriores em perder vôo naquele aeroporto, conseguiu fazer com que embarcássemos. Curioso que dessa vez tive uma recepção bem diferente da anterior com os portugueses. Foi patada atrás de patada. Será que eles perderam a paciência em quatro meses? Pode ser a crise, né? É, é a crise.

Lembrei da minha viagem em abril deste ano e do quanto estava ansioso e com um certo medo da viagem ao Velho Mundo. Mas dessa vez foi tudo tão tranqüilo, talvez por que minha preocupação toda tenha ficado em Belém e nessas Seletivas com o show do Otto. E também porque agora é apenas um país e duas cidades.

Já na Espanha, vim em um carro com Taubkin e um motorista gente boa, mas que se estressou com o trânsito na saída de Barcelona. Optamos por deixar o estresse só para ele e tirar uma bela pestana até a cidade. Abria os olhos com pequenos e lindos vilarejos que se acumulavam antes de chegar a Vic. Já na cidade –  pequena, bela e desenvolvida em uma primeira análise - , o motorista deixou Benjamin em um hotel que mais parecia um castelo e me trouxe a um albergue, que mais parecia uma escola norte-americana. Gostei do lugar com uma bela vista da janela (que estou de frente até agora vendo os últimos raios do dia). No albergue, ao menos, estou sozinho no quarto. Ufa! Depois de uma soneca para me recuperar das 25 horas de viagem, vou enfim dar uma banda pela cidade e tentar encontrar o Talles Lopes, presidente da Abrafin que, até onde entendi, está em um outro hotel, diferente do meu e do Benjamin.

Amanhã ou depois mando mais notícias.

Fim de tarde em Vic

quarta-feira, 7 de setembro de 2011

Sinto que minha sorte vai mudar



O maior problema de descer ladeira abaixo na rua do azar é que quanto mais se lembra disso, mais demorada fica a fase. Tenho vivido uma série de acontecimentos que deixam qualquer ser humano cabisbaixo, pensando na vida e entornando mais do que o normal. Pois é, além de ficar mais de um mês sem escrever aqui, ainda chego com notícias não tão boas. É um desabafo, mas não é deprê. Gosto de rir do destino, esse sacanão.

Acho que tudo começou com um pedaço de maminha lá em Marabá. No rodízio da churrascaria a bela peça de carne se mostrava sapeca, com um ar de devora-me a qualquer preço. “Mestre, tire essa parte aqui pra mim. Gordura sim, mas só na ponta... beleza, isso”. No que a garfada me trai, o pedaço ao invés de estacionar no meu prato, fez uma desastrosa escala em cima do iPhone. Tá, beleza. Risadas na mesa, iPhone sendo limpado e a maminha, enfim, no prato. Depois o que acontece? A gordura que escorreu pelo auto falante do telefone entupiu suas artérias e deixou a pessoinha lá do outro lado com o volume super baixo. Agora me diz como é que a porra do Steve Jobs não prepara o bicho para uma churracada?

Já em Belém, em uma dessas manhãs de trabalho, eis que aperto o alarme para destravar as portas do carro e percebo que o havia deixado aberto na noite anterior. Lá se foi o som e uns 12 CDs que me acompanhavam naquela semana. Fiz questão de não lembrar os títulos, mas de vez em quando me vem na cabeça um. O ladrão roubou meu boné também. Não me importei muito com o som ou o boné, mas os CDs foram foda. O vagabundo nunca vai saber o que é Neil Young, Cérebro Eletrônico, El Cuarteto de Nos e Manic Street Preachers.

Fora isso tem a desilusão no trabalho, as dificuldades de produção (tudo bem, essas sempre estiveram lá) e os vai e vem da querência. É, Morais Moreira, é nesse vai e vem que a gente se atrapalha. Mas aí tive uma atitude que pode, definitivamente, mudar o rumo das coisas. 

Uma vez alguém em uma mesa de bar apareceu com uma nota de dois reais com a esfinge da república maquiada de Kiss e com o nome da banda logo abaixo. A nota foi parar na minha carteira depois que convenci a pessoa a trocar por outros dois reais ordinários. Coloquei ali na carteira como um amuleto. A nota não me deu sorte em nada, mas também não deu azar. Mas como uma forma de me livrar da zica, passei adiante para o rapaz do estacionamento do meu banco.

Se a coisa melhorar eu começar a ganhar muito dinheiro juro que monto o Kiss Cover de Belém.





domingo, 31 de julho de 2011

Antes que se perca a memória





Quero uma mina de Marte
Que seja sincera
Que não se tatue, nem fume
E nem saiba sequer
O que é Rock'n Roll...

(Marcianita - J.I. Marocne)

 
“Nunca havia pensado em escrever um livro. Tenho muitos amigos escritores e nunca me senti capaz de escrever um livro. Até nascer minha primeira neta. Foi quando resolvi escrever minhas memórias, para que elas nunca se apagassem”. Freddy Ginebra disse isso no almoço, depois que entregou a cada um dos produtores que ele estava recebendo em sua cidade dois de seus livros. Um era de conversas com pessoas como Jorge Luiz Borges, Mario Benedetti e Gabriel Garcia Marques – que acredito que sejam os amigos escritores a quem ele se referia. O outro livro se chama “Antes de que pierda La memoria”, lançado pela Casa de Teatro, sua fundação cultural privada, em Santo Domingo, que lança livros, discos e promove mostras de teatro e cinema. Freddy, do alto de seus 67 anos, é uma figura inspiradora para quem um dia resolveu trabalhar com cultura.

Cheguei perdido na noite de quinta-feira em um dos eventos que fazia parte de toda a programação que ele e sua Casa de teatro preparam para receber os produtores culturais de 12 países da América Latina. Encontrei Felix Allueva, meu elo com aquele encontro. Félix, em sua gentileza infinita, saiu me apresentando para todos os outros produtores que estavam por lá. Até chegar em Freddy, um senhor grisalho de olhos azuis que me recebeu com um beijo no rosto. Perguntou como eu estava e se eu queria beber algo. Disse que uma cerveja, e então ele chamou a mocinha de uma das barracas de bebida e disse: “este es Marcelo, darle cerveza”.

No outro dia, no mesmo lugar em que ele selecionou 30 artistas para se apresentarem, era ele quem ia para o palco apresentar. Na verdade, Freddy chamou um humorista de stand up comedy para fazer essas apresentações, mas era ele quem sempre ia e roubava a cena. O humorista se chamava Carlos Sanchez, e me pareceu uma espécie de Rafinha Bastos da República Dominicana - com a diferença de que o dominicano era realmente engraçado e não um palerma convencido.

Soube da importância de Freddy ao chegar no aeroporto, quando um senhor com uma placa escrita Casa de Teatro nos esperava no corredor, antes mesmo de chegar ao saguão. Estava no vôo comigo mais três pessoas da Costa Rica que chegavam na República Dominicana naquela tarde chuvosa de quinta-feira. Nos levou até a sala VIP do aeroporto. Ainda meio perdido na confusão de sotaques latinos, ouvia se falar muito no nome de Freddy, que já havia lido nos emails trocados entre os produtores daquele encontro. Na van, a senhora que nos recepcionou passava o telefone para uma das pessoas da Costa Rica, Silvie. Ela, então, passou o telefone para outro produtor e percebi, naquele momento, que Freddy era o Padrinho, a grande figura da República Dominicana.

Durante o jantar da sexta-feira ele nos avisa que teríamos que acordar às 6h de sábado, pois pegaríamos um ônibus e depois um catamarã (que não é o mesmo que você está pensado, e sim uma lancha apertada, rápida pra caralho e que deixa rapazes de apartamento com o cu na mão) até uma ilha belíssima. Como a noite anterior foi longa, todos chegaram quase às 6h no hotel. E às 7h lá estava ele, de pé e colocando todo mundo no ônibus. Fui cumprimentá-lo com a mão estendi, ele jogou a mão para o lado e deu aquele abraço. Não tem mau humor matutino que resista a Freddy. Ônibus, praia, lancha, praia, barco, sol. E lá estava ele, em pé e contando histórias que todos os outros produtores paravam para ouvir com a atenção de um estudante fissurado em uma aula bacana.

À noite, quando já achava que não teria mais fôlego nem para ir jantar, lá está ele de novo. Elegante e sorridente. Nos conduziu para o seu teatro, apresentou o espetáculo de dança contemporânea e sentou-se. O espetáculo era realmente bom. Bom até para mim que não sou chegado a teatro e muito menos dança. Mas enfim, você sabe como é teatro, sempre rola um peitinho. E é claro que no final todas as dançarinas ficaram nuas. Dom Freddy é realmente um homem de bom gosto.

Lembrei do dia em que cheguei e estava indo para o hotel na van. Cecília, a senhora que nos recebeu e que pareceu ser o braço direito de Freddy, ficou puta da vida porque o motorista, para cortar caminho, passou por dentro de uma periferia. Ela disse que não queria mostrar aquela parte de sua cidade. Eu entendi sua preocupação, apesar de não concordar. Não tem como fugir da realidade de um país deslumbrante mas que carrega a medalha de bronze de terceiro mundo. E a mim aquela realidade não importava. O que realmente importou foi conhecer um homem que viveu a vida inteira promovendo a cultura de seu país, com dinheiro do bolso, sem ajuda do governo e contando com sua rede de amigos.

Soube na noite que cheguei que no almoço daquele dia estava na mesa o conterrâneo dominicano Juan Luis Guerra, o astro mais conhecido nascido naquela ilha. Mas como disse Ritzza, a simpática produtora de Honduras, ao me consolar: “naquela mesa quem importava mesmo era Freddy”.


Freddy brinda de cuba libre na bela jarra da Se Rasga