sexta-feira, 2 de maio de 2008

Não esqueça de apagar a luz



“Todo cerrado mañana!” Os avisos não brincavam. As filas enormes no supermercado pareciam um abastecimento para que as pessoas ficassem em seus bunkers para um dia inteiro de ataque inimigo. Nas bancas de revistas, os avisos: “No hay diários mañana”. Tudo isso precedia o maior day off que presenciei na vida. Em Montevidéu, o feriado de 1° de Maio era o terceiro mais levado a sério do ano, ficando atrás apenas do Natal e do Reveillon. Sem ônibus e com pouquíssimos táxis nas ruas. Sem cinema, espetáculos ou qualquer coisa para distrair. Havia uma ordem: fiquem em casa, curtam as crianças e não ousem tentar fazer alguma coisa que force um trabalhador a sair de casa, respeite o dia do trabalho. Perfecto!

Meu amigo Emílio preveniu dizendo para eu comprar comida e me preparar para ficar em casa. Acordei com um silêncio que parecia ser 7 da manhã. Já era meio-dia. Ótimo, havia perdido metade daquele dia inútil. Andei pela cidade atrás de um cyber e contemplei um cenário mais tranqüilo ainda do que nos dias normais. Parecia a Londres desertada do filme Extermínio, de Danny Boyle. Na rodoviária, achei um café aberto e tive, pela primeira vez, o pior atendimento de minha vida no Uruguai. A mocinha impaciente me serviu um café e uma água. Tomei acuado.

À noite, ia encontrar o amigo Leonardo Aquino, que estava na penúltima cidade de suas férias, junto à sua mãe, a simpática ex-colega de trabalho, dona Myrian Magalhães. Temi que eles tivessem a mesma impressão que tive quando estive aqui em 2006, quando fiquei no bairro de Pocitos e caminhava quadras e quadras vendo poquíssima gente pelas ruas. Eles pretendiam passar a tarde em Colônia de Sacramento, patrimônio histórico da humanidade, cidadezinha linda que fica no meio do caminho da rota de Buenos Aires a Montevidéu. Lá, eles disseram, nem a rodoviária estava aberta.


(um parêntese para a TV uruguaia)

De noite, antes de me aventurar pela avenida 18 de Julio atrás de um bar para uma cerveja com Leo, fiquei em casa fazendo umas anotações com a TV ligada, onde passava um programa interessantíssimo no que seria a Rede TV! local. Nele, um apresentador ficava sentado em frente a uma pessoa e lhe fazia perguntas pessoais onde, abaixo, havia um detector de mentiras mostrado para o telespectador. A entrevistada era uma mulher linda chamada Natasha. Ela respondia a perguntas como: “É verdade que você, Natasha, já fez sexo em troca de um cigarro?”. Ela respondia tudo sem medo e o detector aprovava. Sexo com mulheres? Sim. Sexo com dois homens? Sim. Sexo com uma celebridade apenas para se promover? Não, isso não. Natasha era uma puta classe A. Percebi, então, que se tratava de uma espécie de Núbia Oliver, Cristina Mortagua ou uma Daniela Cicarelli mais destrambelhada. Antes do intervalo, ela perguntou se poderia fumar e a produção disse que não. Então um whisky por favor. Sim, serve um whisky para Natasha, a verdadeira mulher uruguaia.

(fechou o parêntese)

Depois da cerveja, caminhei umas cinco quadras após meu amigo ter seguido para o seu hotel. Estava quase para correr de tão desesperado para mijar. Eu sabia que não encontraria nada aberto naquele dia, nenhum banheiro salvador, só em casa. Aliviado, percebi que ainda era cedo. Merda de dia que não acaba! Sentei para escrever e depois coloquei um filmeco para rever em casa, Whisky, de Pablo Stoll e Juan Pablo Rebella. Um dos filmes mais belos que assisti sobre a realidade classe média em Montevidéu, que me mostrava que aquele dia que passou era apenas um dia morto, mas que algumas pessoas dessa cidade já estavam mortas e esqueciam de largar a vida.

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