domingo, 22 de junho de 2008

A musa do espelho ao lado

As pessoas tentam nos colocar pra baixo
Só porque estamos por todos lados
As coisas que eles fazem parecem terrivelmente frias
Espero morrer antes de ficar velho

Falo da minha geração, essa é a minha geração, baby.

(My GenerationThe Who)



Ela decidiu que a beleza não seria sua carta de apresentação, então se debruçou sobre best-sellers, discos do Chico, decorou rótulos de vinhos e decidiu que por trás daquele rosto, peitos e abdômen perfeito, existia uma mulher de conteúdo. Boa parte desse gosto veio da herança de um namorado antigo, mais velho e disposto a moldá-la. Depois, mais experiente e vivida, criou o perfil ideal para abalar a moçada de sua geração – por mais que alguns livros ela tenha abandonado na metade e tenha relido umas duas vezes “aquela metáfora” do Chico.

No Orkut era das mais acessadas. Na faculdade, entrava no grupo de trabalho dos nerds. Nas festas, ficava de olho nos garotos de cabelos arrepiados. A musa reinou em outros meios, que jamais ficariam indiferentes à sua beleza. Ela, no entanto, nunca deixou de ir à academia ao cair da tarde, onde mirava a futilidade e o culto estético das loirinhas de piercing no umbigo (que faziam nossa musa se envergonhar do seu).

Ela costuma namorar cara de banda. Geralmente são bonitões, de estilo cuidadosamente despojado, com corpo sarado e uma banda horrorosa por trás para sustentar o sonho de empunhar uma guitarra. O talento falta onde a beleza impera, mas o estilo “alternativo” não vem acompanhado de más intenções. De tanto forçar a barra, teve uma vez que um Orson Welles realmente caiu bem ao casal, e eles se surpreenderam de ter gostado tanto do filme.

A grande merda para ela foi ter que acabar o namoro com o cara que tinha um perfil muito semelhante. Quem vou achar agora numa cidade como essa? Daí teve uma hora que resolveu deixar esse estilo “alternativo” de lado, deu um trato de luzes nos cabelos, meteu o vermelho nas unhas e encarou uma fila enorme na frente daquela boate badalada. Lá, até dançou umas músicas que já tinha esquecido de odiar. Bebeu, se pegou, deu, se arrependeu, ligou, ele não atendeu e ela se fudeu.

A um passo de encontrar Jesus, ela resolveu ir com calma e pensar melhor sobre aquilo, foi quando decidiu mudar de cidade e encarar uma pós lá fora. Agora é só esperar o raio cair no mesmo lugar, e mandar um “alternativo” rico cruzar o seu caminho.

Não se oprima de achar que estou escrevendo para você, minha querida. Parafraseando o Pete Townshend lá de cima: “Eu não estou tentando causar uma grande sensação. Só estou falando sobre a minha geração”.

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