sexta-feira, 6 de junho de 2008

Amores e cafés expressos

Um expresso duplo, um baguete francês de rosbife e mostarda e todo o tempo do mundo. Me dei as horas da tarde agradável daquele almoço tardio em Belo Horizonte para me entregar à leitura de Garcia Marques e suas putas tristes.

Ele, de cabelos cacheados, olhos claros e estilo modernoso e jovial entrou acompanhado dela, de olhos azuis, cabelão comprido e uma estatura de chamar a atenção e típica da mulher mineira.

No livro, a cada sentença mais terna que a anterior, Garcia Marques narrava em primeira pessoa a história de um velho jornalista de 90 anos que resolve se dar de presente de aniversário uma ninfeta de 15 anos. O Nobel de Literatura na minha mão ficou dividido entre suas linhas, que causam envergonha a quem pretende ser escritor, e a conversa do casal ao lado que, diferente de mim, havia pedido apenas um suco de abacaxi como pedágio para ocupar aquela mesa do suntuoso estabelecimento.

“Ele disse que eu era a mulher da vida dele, mas eu não sei se isso é verdade. A gente se separou, mas eu fiquei confusa”, explicava a jovem. Ele ouvia tudo resplandecido de uma paciência de alguém que ainda cozinharia aquela carne até níveis avassaladores de uma paixão. O leitura corria magnífica, mas a conversa ao lado era real, então levantei bem a antena e pude perceber que o rapaz havia viajado para o exterior e, antes de ir, a moça não pôde ter o que parecia estar pré-determinado a acontecer por ainda estar namorando. Não sei se foi bem isso, mas preferi confiar na nobreza dela que, num momento em que virei para ver a cena, flagrei seus olhos brilhando e mirando de perto os olhos dele. Aquilo eram olhos apaixonados que eu, você e ele sabemos muito como são. Os olhos imploravam por um beijo, que ficou no ar e foi trocado por um abraço – que ela pediu. Ou ele era viado ou muito disputado ou não entendi direito a história do namoro. Mas posso apostar que a essa hora ela está com o coração ensebado de paixão.

Garcia Marques, no entanto, ainda está rumando para o final onde, a cada página, descubro que a maturidade e a estrada na literatura é um progresso inesgotável e que só um bom observador pode chegar a esse nível. Meu papel de espião está sendo cumprindo à risca. Tome cuidado para não demonstrar muitas emoções ao meu lado.

5 comentários:

Iuri Fernandes disse...

"Ou ele era viado ou muito disputado"

Rapá, ele era mineiro...
heheheheheheheheheheheheheheh...

titaklautau disse...

Estou aqui com o papai, ele achou um bom texto, e alem do que vc é uma exceção da nossa geração; pois a ultima geração que leu realmente foi ate um pouco depois da dele.

Mi, de Camila disse...

"Rapá, ele era mineiro..."
Assino embaixo.

Let Azevedo disse...

Não me pergunte o porquê, mas não gostei de "Memórias de minhas putas tristes".
Concordo com a galera do "Ele era mineiro".
hehehe

Marcelo Damaso disse...

Letícia, acho que não existe uma resposta pra isso. Um livro é igual um novo amor; ou te pega de jeito ou é desprezado, sem meio termo.
No meu caso, sou capaz de dizer que me envolvi bem mais com "Memórias..." do que o clássico "Cem anos de solidão".